Fugitivo.

Chovia copiosamente. 
Era um dia que fazia jus àquela estação do ano, em que quase ninguém se atrevia a sair do conforto do lar. Quase! Com excepção de poucos. Mário era um deles. 
Fugiu de casa desprotegido e sem destino. Rosto fechado, olhar vagabundo e mãos cerradas. Passo gigante, ritmo ofegante, de alguém que corre atrás sem saber bem do quê. De alguém que é indiferente àquela bátega ou a um dia de sol. 
Mário seguiu o rumo da sua desorientação que o levou até à praia. Aí, esvaiu-se sobre a areia, antes dourada, agora castanha, resultado mágico daquela chuva. Mas, Mário, não se deleitava com nada como também não se desencantava. 
Na sua cabeça existia um único balão de pensamento. Aceitaria, se pudesse, que aquele dilúvio lhe levasse o que lhe ia na alma. Teria entendido bem? (sabia que sim, esperando que não).
Quem o avistasse da estrada, não deixaria de se interrogar e preocupar sobre o que fazia na praia, no meio daquela tempestade. Mário procurava apenas um local que transbordasse espaço, permitindo-lhe assim processar tamanha informação. E o que melhor que uma praia deserta num dia de Inverno?
Mário levantou a cabeça em direcção ao céu e deixou que a chuva lhe lavasse as ideias. Seguidamente meteu a mão ao bolso e daí retirou um envelope. Abriu-o, fechou-o e, furiosamente, rasgou-o em dois. Amarfanhou-o e voltou-o a guardar. 
Como era possível? Não podia acreditar! Faltava apenas um dia para deixar  de ser um fugitivo da justiça. Mais um dia e ter-se-iam passado vinte anos. Como tinham descoberto o seu disfarce apenas a um dia do prazo de prescrição? Como iria contar à sua família que tinha sido ele quem cometeu aquele crime? E que já não mais podia ser Mário, porque Eduardo acabara de dar à costa.

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