Porque hoje é o dia dos Avós

             Lembra-me de um dia ter desabafado com a minha psicóloga sobre o quanto o ser humano era egoísta, sobre o quanto isso me revoltava e, ao mesmo tempo, pesava na minha consciência. Sim, porque eu também não ignorava a minha quota de responsabilidade.  

Num dia, gélido, telefonaram-me. No meio da azáfama do trabalho saiu-me: que raio querem agora? Só queriam avisar-me que a minha avó materna tinha sido encontrada caída, sozinha e levada para o hospital. 

Dirigi-me para lá. Deparei-me com o sofrimento da minha mãe: a médica dissera-lhe ser o fim. Não acreditei, (como é meu hábito). Ficamos lá horas. Mais tarde percebi a exaustão da minha mãe e disse-lhe que fosse descansar um pouco. Eu ficaria lá -prometi. 

A minha avó, numa sala das urgências, com um simples lençol a tapar-lhe o corpo. Achei que tinha frio. Tirei o meu casaco de pelo castanho e cobria-a. Beijei-a. Afaguei-lhe as mãos. E disse-lhe que ia ficar boa rápido. De repente, do nada, ela balbuciou umas impercetíveis palavras que, até hoje, não entendi.

As horas passavam, mas eu mantive-me fiel à minha promessa. De quando em vez, aparecia um médico novo e espreitava. Já tarde da noite chamou-me ao seu gabinete. Aconselhou-me a ir embora. A morte podia demorar horas ou dias. Refutei! Não queria crer e muito menos ir! Perguntou-me onde a minha avó gostaria de morrer. Em casa, sem dúvida. Aconselhou-me a ir preparar tudo como ela quereria. E eu fui! 

São muitas vezes em que me arrependo de não ter ficado! 

Noutras interrogo-me se a minha avó ao proferir aquelas impercetíveis palavras não me estaria a mandar embora, ao seu estilo generoso. 

Esta dúvida corrói-me há anos. Só me tranquilizo quando visto ou abraço aquele casaco. Ainda me cheira a ti, querida Avó. Alguma vez me esclarecerás?





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