Perdoar

Luís estava feliz.
Finalmente, férias.
Liberdade para fazer o que queria.
Mas tinha agendado no calendário, a vermelho sangue, uma visita à livraria secular da sua cidade. 
No dia e hora marcados, Luís foi.  Levou consigo, como habitualmente, todo o tempo do mundo. Para ver as novidades, os seus autores preferidos e os novos badalados na praça.
Quanto prazer tocar num livro e desfolhar as suas folhas! Que felicidade tomar conhecimento de novos enredos!
Ali, sim, era feliz. 
Já era conhecido e ninguém o importunava.
Podia ficar desde a abertura ao encerrar.
Só que, naquele dia, uma mulher chamou-lhe a atenção.
Recostada num canto da livraria, mãos beijando um livro aberto ao ritmo das palavras que pronunciava.
Que teria de tão encantador aquele livro?
Luís, decidiu satisfazer a sua curiosidade e devagarinho, aproximou-se. Da voz embargada daquela mulher, ouviu dizer:

Peço-te perdão.
Perdão que não é desculpa.
Perdão daquele que nos vem das profundezas da alma.
Perdão que nos leva junto o coração.
Não me leias como chantagista.
Vê apenas em mim alguém que passa por momentos de desespero e que, por causa deles, se transforma. 
Sei, és um anjo na terra, não o mereces. 
Sei, tu és a razão do meu viver.
Por ti, ainda vou continuando.
Contigo estou a aprender que tal razão, primeiro, tem de residir em mim. Esta aprendizagem não é fácil, tu sabes. Como sabes que serei capaz de aprender. 
Por nós. 
Ainda que tempo leve.
Quisera eu poder explicar-te o que sinto quando te olho, quando oiço a doçura da tua voz e quando me dás, de forma tão despretensiosa, esse lado tão tranquilo e angelical. 
Mas o meu amor por ti não é sequer mensurável.
Perdoas-me? 

Luís teve de afastar-se. Foi-lhe difícil segurar as lágrimas, resultado da simbiose das emoções com a literatura.

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