Insónias

  

Estava uma noite de calor ardente. Isabel deitou-se mais tarde. António já dormia serenamente. Ela invejou-lhe a tranquilidade. Flashes da sua vida começaram a disparar: a morte recente do amigo. Vieram-lhe à memória as palavras do pároco no funeral e o castigo mental que autoinfligiu por nelas procurar o sentido que não encontrava.  Porquê? Para onde? Para quê? – foram algumas das questões que ficaram sem resposta. 

Enquanto o suor dançava no seu corpo, Isabel tentava que aquelas recordações se afastassem, exercitando a sua respiração em simultâneo com a de António. Mas aquela geminação foi sol de pouca dura. Logo novas imagens se perfilaram na fila de espera. O avançar da idade preocupava-a. Não propriamente a sua, mas ao pensar na dela surgia-lhe, por inerência, a dos pais. A consciência dessa finitude interrompia-lhe a vontade de dormir. 

Isabel fazia por se distrair, fixando a atenção no seu companheiro já que ele continuava a dormir profundamente. Ela tentava marcar o mesmo compromisso consigo embora sem sucesso. Desta vez, a invadir-lhe os pensamentos, a história que amiga lhe tinha contado ao jantar – aquele estúpido acidente que vitimara o amigo da filha. Só conseguia pensar na dor daqueles pais. O dramatismo da situação roubou-lhe mais minutos de descanso. Ao seu lado, António respirava pausadamente. 

- Pensa em coisas boas, Isabel! – ordenou a si própria, para logo entrar em incumprimento.

Que raios!

Isabel sabia que a sua vida tinha muitas histórias repletas de positividade. Mas, naquele momento, nada lhe vinha à mente. Tinha sido vítima de um destemido assalto a este tipo de pensamentos. Agitada, virou-se. António mexeu-se e ajeitou-se na cama, abriu e fechou os braços enrolando-os à volta dela. Isabel sentiu-se confortada e protegida naquele bunker que lhe deu guarida. Por fim, sossegou e adormeceu.

 

 

 

Comentários

Mensagens populares