Amute

  



 Andava na pré-escolar. Como criança que era detestava beijos. Por isso, odiava quando a educadora de infância me punha a dormir com a Maria, a beijoqueira de serviço. Lambuzava-me todo. Cheguei mesmo a inventar estratégias para me livrar dela. Fazia-me de morto, que é como quem diz, fazia de conta que já dormia. Mas sem sucesso. Nada adiantava para me ver livre dela. Maria agarrava-me a cabeça, virava-a para si e procurando a minha boca, beijava-a. Uma, outra e mais outra vez. Sôfrega. Desassossegada. Como se não houvesse amanhã! Endoidecida ainda me dizia: amute. E eu acabava sempre da mesma forma: a chorar. E lá vinha a educadora por ordem naquela desordem. 

Cresci. A Maria também. Fomos juntos para a primária. Mas nem a idade a fez ganhar juízo. Continuou assanhada! Sempre que me apanhava a jeito, enchia-me de beijos – e de amutes. Eu morria de vergonha e fugia dela a sete pés. Mas eram mais as vezes que ela me apanhava e fazia chacota de mim. Os meus amigos diziam que namorávamos. Eu negava-o - até porque nem era verdade. Só que de nada adiantava.

Crescemos. Fomos para a mesma turma do liceu. A Maria deitou corpo: corpo e mamas. E eu reparei na Maria, na precisa ocasião em que ela me trocou e começou a beijar o Francisco atrás do ginásio. Achavam-se bem escondidos.  Mas não estavam. Eu bem os via, aos beijos e amassos. Roído de ciúmes, questionava-me se ela também lhe diria amute. Deve-lhe ter dito porque acabaram casados e com filhos.

Hoje estou com trinta e cinco anos. Continuo solteiro. À espera de ganhar coragem para beijar a Maria que se divorciou do Chico. Foi traída. Coitada! Quando eu que tenho tanto amur para lhe dar.    


Comentários

  1. Força, CORAGEM
    Declare se
    O que de pior pode acontecer é uma nega,mas.....
    Não se pode arrepender de não se ter declarado
    Sabe se lá...
    A Maria ainda o AMA

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