Saudade


Olho ao meu redor e vejo o teu lugar: vazio. Nem me consigo sentar à mesa. Não aceitei a oferta da solidão no teu assento. 

Os lençóis, de flanela, são gélidos. Desde que me foste, que os meus pés choram a falta dos teus; as minhas mãos sofrem com a ausência do calor das tuas. O meu corpo já não passeia: só espera pelo decorrer do tempo. Hoje os dias têm quarenta e oito horas. E as noites, Amor? Cada uma dura um mês. 

Ontem chamei-te: baixinho, para não te acordar. Depois gritei pelo teu nome - mas tu não ouviste. Levantei-me. Vaguei pela casa à tua procura – porém não te encontrei. Voltei a deitar-me e, então, recordei-me que Tu me morreste e que eu me morri.

Amanhã, Amor, vou abrir a janela e quando te vir, em modo de astro cadente, vou cantar-te os parabéns. Não te esqueças de comprar aí o bolo e as velas - são o nove e o zero. Não te olvides de acendê-las – e apagá-las. Pede o bolo sem recheio para não te fazer mal. Queria tanto dar-te um presente! - mas não sei o que te faz falta. Deixaste cá tudo. Deves andar numa figura!  Espero que pelo menos tenhas levado dinheiro. Há lojas, por aí? Logo tu que detestavas ir às compras. Mas põe-te apresentável: nunca te esqueças de como deve andar um verdadeiro senhor. São imensas as saudades de te ver de fato e gravata! Ficavas tão jeitoso! Orgulhava-me tanto de ti. 

A Maria obrigou-me a dar todos os teus pertences a uma instituição de caridade. Custou-me horrores. Chorei tanto! Agora nem posso abrir a porta do guarda-fatos e imaginar-te. Mas escondi o teu perfume e fiz dele o meu. Pelo menos assim, posso cheirar-te. E como cheiras bem, Amor!

 

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