Surprise.

- Filipe, levas as miúdas ao Colégio? Tenho que deixar tudo adiantado, antes de ir para o trabalho, para o jantar de amanhã à noite. Posso contar contigo? – perguntou, delicadamente, Maria.
Mas ele já dormia o sono dos injustos, espalmado no sofá, por isso nem a ouviu.
Maria aproximou-se dele. Abanou-o, calmamente, o que também não resultou.
Foi obrigada a aplicar um pouco mais de força e Filipe acordou.
Que queres Maria? – gritou-lhe.
Ela repetiu.
Ele respondeu-lhe:
- Não posso. Tenho reuniões todo o dia, a primeira logo às nove da manhã. Tinha de me levantar muito mais cedo e não estou para isso. Arranja-te!
Maria ainda tentou argumentar que o jantar era com os amigos dele. Mas nada o demoveu. Maria quase implorou:
- Trazes pelo menos o vinho?
- Ok, o vinho compro, mas não me chateies com mais nada.
E Maria não chateou. Apenas lhe disse:
- Vê lá se não te atrasas. O jantar é às 22 horas.
Pouco faltava para as dez da noite e Filipe tinha acabado de sair do seu escritório.
Raios, sempre a mesma correria. Logo hoje que o Rui e a Joana vão jantar lá em casa.
- E isto hoje que não anda. Estou parado aqui na fila de trânsito já há mais de meia hora. Ups, esqueci-me do vinho. Fiquei de o levar. Vou comprá-lo agora? Onde? Ah, já sei, naquela loja de conveniência perto de casa. Vou pagar uma fortuna, mas que se lixe, não posso chegar lá sem o néctar dos deuses – continuava Filipe desabafando.
Finalmente à vista a loja de conveniência. Filipe sai a voar do automóvel, como se fosse correr uma verdadeira maratona. Compra o vinho. Entra também nele a voar.
- Cá está ele. Até me matavam. Agora é só chegar a casa. – continuava a falar sozinho.
Arranca como se não houvesse amanhã. Trava repentina e bruscamente. Ufa, foi por pouco, quase que atropelava um peão na passadeira.
- Pronto. Já passou. Foi só um susto. Podia ter sido pior.  Mas lá chegando, logo lhes explico. Coitada da Maria que leva com isto todos os dias e, ainda, com o meu mau humor. - pensou para si.
Estaciona o automóvel na garagem num ápice.
Corre em direcção a casa.
Ao abrir a porta diz:
- Cheguei, cheguei...
Mas eis que dá de caras no hall de entrada com Rui e Maria sozinhos, os quais nem por ele deram. Filipe também fez para que, por ele, não dessem.
Rui e Maria estavam encostados à parede. Aquele insistia em roubar-lhe um beijo. Maria só dizia NÃO RUI, NÃO!
Rui insistia:
- Por favor Maria, fica comigo. Ele não te respeita, não te ajuda, humilha-te. Ele não te ama Maria. Comigo sim, serias feliz.
Maria só dizia:
- Não insistas Rui, por favor. Tenho uma família. Tenho filhas. Tu tens mulher. Não posso. Não podemos. Cuidado, as miúdas estão lá dentro.
- E tu, não és gente, não contas? E eu? Eu tenho mulher?  E tu tens marido? Onde os vês? Onde eles estão? – perguntou-lhe.
E enquanto tentava beijá-la e abraçá-la - dizia-lhe:
- Larga já tudo. Vamos sair já daqui. Vamos ser um casal verdadeiro. Prometo-te fazer-vos feliz.
Maria começava a fraquejar.
Filipe estava bem longe de ser o marido com que sonhara e que prometera.
Mas eis que este se apercebe do início do fraquejo de Maria. Era chegada a hora de ele entrar em cena, antes que o cenário desabasse por completo e para sempre. Por isso, o saco que Filipe trazia na mão caiu, propositadamente, no chão. Ouviu-se o barulho de vidros partidos. O chão, vermelho do vinho tinto. Do mesmo vermelho de raiva das faces de Filipe que este escondeu baixando-se, enquanto amontoava os restos das garrafas partidas.
- Oh, vocês estavam aí? E agora ficamos sem vinho, raios. Que chatice. – desabafou.
Maria respondeu-lhe:
- Não te preocupes. Eu tratei do vinho também. Vim abrir a porta ao Rui. Estávamos à tua espera e da Joana que também ainda não chegou. Chegas tarde e ainda dás trabalho. - desabafou.

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