Existe Futuro?


Deitada, olhar vazio, perdida. Firme do insucesso da terapia. Apenas cumprindo número em mais uma sessão, para aí arrastada pela obediência à preocupação dos pais. Sabia que os desiludiria. Já tinha tomado a decisão de que um dia não mais estaria presente. Era a única certeza que tinha e a única da qual necessitava.


- Porque tanto se auto-inflige? – perguntei à Catarina.
- ...
- Vá lá, não se feche assim, não lhe faz nada bem. Diga-me o que sente.- insisti.
- Nada.- rezingou.
- Calma, Catarina. Olhe bem à sua volta, veja tanta gente:  vivendo,
tranquila, feliz. 
- Não me diz respeito.
- Claro que diz. A Catarina tem o seu espaço, o Mundo também é seu.- argumentei.
Eu e o Mundo somos incompatíveis.- afirmou com uma frieza arrepiante.


Quão difícil era a terapia com quem já tinha editado o episódio final da sua vida!
Era muito raro sequer conseguir quebrar-lhe o gelo ou mantê-la presa àquele espaço.
Sentia-me frustrada, incapaz de a ajudar.


- Catarina vamos estabelecer um compromisso?- questionei-a.
- Compromissos? Não, não são a minha praia.- afirmou.
- Tentemos nestas sessões perceber como podemos preencher o vazio que sente.
- Não vamos conseguir.- assegurou.
- Cada uma por si talvez não, mas juntas... É possível, acredite.
- A doutora é crente...depois de tudo... Não entendo!
- Porque eu não a vejo como uma desistente. Olho para o Mundo e encontro lá o seu lugar.
- Pois, mas eu não tenho esse sentimento de pertença, nem do mundo, nem de mim própria. E são sentimentos fundamentais para alguém poder seguir adiante.
- Catarina, isso acontece porque está doente, deprimida. Mas há cura.
- No meu caso, não. Troquei a cura pela doença.
- Permute outra vez. Ainda vai a tempo. Pelo menos, tente.
- (Será?)

Comentários

Mensagens populares