Negligência
- Manel, vê a mensagem que acabei de receber:
“CH Sudoeste
Mensagem
segunda-feira, 09:30
Lembramos que a Ex.ma. Sra. Maria Fátima da Silva tem consulta de Ginecologia no dia 23/11/2019, pelas 11 horas, no Centro Hospitalar do Sudoeste”.
- Até que enfim! Já não era sem tempo.
- Vou já por na agenda para não me esquecer.
(...)
- Bom dia.
- Bom dia, Sra. Dra.
- Não tenho boas notícias para si. Vou ter que a encaminhar para Oncologia. A Senhora tem um carcinoma mamário em estadio IV.
Maria empalideceu. As células malignas logo lhe atacaram a fala. Emudeceu. E assim chegou a casa, onde lhe foi difícil articular palavras para contar o sucedido.
- Só quero que estejas tranquila para a cirurgia. Vai correr tudo pelo melhor. Vais ver. - disse-lhe o marido.
- Isso dizes tu agora! Quando me vires amputada, só com uma mama, não vais dizer o mesmo. - desabafou, chorosa, Maria.
- Não digas isso. És e serás sempre a minha querida mulher. E depois farás a cirurgia reconstrutiva.
- E quimioterapia também. As faces incharão, o cabelo cairá...
Ele tapou-lhe a boca e abraçou-a.
(...)
Pegou-lhe na mão e apresentou-se:
- Sou a anestesista, vai correr tudo bem.
(...)
Maria acordou na sala de recobro. Os olhos fixaram-se no seu peito enfeitado com drenos. As lágrimas desceram-lhe pelas faces. Vieram-na buscar. Levaram-na para a enfermaria. O tempo passava ao ritmo que as dores aumentavam.
O cirurgião veio falar com ela. Perguntou-lhe como se sentia. Ela disse-lhe. Ele achou normal, afinal era uma amputação dupla.
- Dupla? Não, Dr., foi só à mamã direita.
O cirurgião pegou no processo clínico, leu-o e perguntou-lhe:
- Maria de Fátima da Silva Sousa, certo?
- Não, Dr., sou só Maria de Fátima da Silva.
O médico estarreceu.
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