Brincar

 Uma criança brinca com um carrinho quando a sua imaginação flutua e a sua visão se ilumina. As mãos afáveis da mãe desenharam no chão os trilhos da sua paixão. As endurecidas do pai ofereceram-lhe as miniaturas que tão habilmente manipula. Sentada no chão da sala metamorfoseada em pista de corrida, ela fala, consigo mesmo, um dialeto ininteligível. É sinfonia aos ouvidos da progenitora e a origem de um gigante sorriso no rosto do procriador. 

Nas mãos do petiz, os carrinhos ganham vida. Descrevem na perfeição cada curva, percorrem rigorosamente cada reta, ganhando asas. Contornam os obstáculos assinados pela mãe. Capotam quando se encontram com o armário, indiferentes ao aumento da sinistralidade. E a criança encanta-se. 

A irmã junta-se à festa. O irmão gosta. A fantasia aumenta. Os pais permitem-lhes o exercício da liberdade de escolha. A ordem lá em casa é só para recrear. São defensores acérrimos de que a criança deve fazê-lo com o que pretender e gostar. Não empunham as bandeiras do cor-de-rosa e do azul, mas agitam a branca para derrubar barreiras. Erguem a faixa onde se lê que brincar é mesmo divertido. E assim permitem aos filhos o melhor dos dois mundos – que as crianças sofregamente absorvem.

 Para eles brincar é palavra eflúvia a praticar; é a ponte que os transporta para o futuro, o gerador que alimenta a quimera. Brincar é calcorrear o caminho até chegar às descobertas, atravessando as suas fronteiras e cruzando as suas metas. Brincar é o despertar dos sentidos. Brincar é ser feliz – e sê-lo -, é consequência tão claramente vítrea. 

Fazer os outros felizes é mais simples ainda. A regra é só não complicar. Não ver fantasmas no lugar de anjos. Acima de tudo é dar liberdade ao sonhar.  

 

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