Parar o tempo

  

 

Maria, dona de uma simpatia glacial e afeto desértico, decidiu que tinha de mandar parar o tempo. Por todas as razões e mais alguma: andava de melindre notório com a vida, vivendo com ela uma relação aguda de respeito encurralado. Só que, para o fazer, não basta carregar num botão - e tudo, como por magia, acontecia de um momento para o outro. Não! Parar o tempo é uma verdadeira arte. E, por saber desta dificuldade, Maria já tinha averiguado junto das amigas se alguma se voluntariava para pressionar o botão. As parvas riram-se! Como se o assunto não fosse demasiado sério! E logo vieram com uma clara prática de informação complexa: (ai e tal e coisa) queres parar o tempo porquê – perguntaram-lhe. Maria, numa de professora de ensino ilustrado que não precisa de tecer justificações, voltou a perguntar-lhes se alguma delas podia clicar no botão saltar para as férias ou no de mudança de ano. Ou quiçá, no botão de eliminar, temporariamente, a sua presença. Elas acharam que Maria estava doida. Só que não. O que ela queria mesmo era avançar no ciclo, passando à fase de: “vamos lá colocar o nosso melhor sorriso e aproveitar um belo e merecido descansoEnquanto isso, estudaria como aplicar à vida o projeto de galanteria instruída - para ver se aquela amainava. Talvez assim conseguisse tirar o gelo da sua fácies e se envolver em carinho curativo. 

Maria sabia que havia sempre um timing para tudo. Fosse tempo para parar o tempo, fosse para o processar ou para gerir emoções. Neste momento, ela aspirava pelo tempo dos silêncios e do respirar. Porque era importante parar - para depois seguir viagem e andar. Depois regressaria o tempo do movimento fazendo, de novo, tréguas com a vida.

 

 

 

 

 

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