NUNCA MAIS
Sou – hoje— tudo o que não queria ser.
Sou cada pedaço de terra queimada.
Sou cada labareda ateada.
Sou cada árvore incendiada.
Sou aquele bombeiro,
segurando a
mangueira sem água.
Sou cada lágrima derramada.
Sou aquele habitante que crê,
apagar o fogo com o balde de água.
Sou o desespero em cada uma de tantas faces.
Sou cada grito lancinante pedindo socorro.
Sou a imagem de cada habitação,
caindo em
pedaços.
Sou cada passageiro daquele comboio,
parado horas na linha
sem luz.
Sou aquele
fumo que intoxica e mata.
Sou quem humedece o casaco e o põe
na cara.
Sou cada veículo com os corpos cremados.
Sou a indignação de quem tudo perdeu.
Sou a gratidão
a todos os anjos.
Sou a homenagem dos que fugiram a pé,
salvando-se sobre chão de cinzas.
Sou a gratidão eterna,
dos que conduziram vidas a porto seguro,
num túnel de chamas e chão ardente.
Sou cada família,
em desespero buscando notícias.
em desespero buscando notícias.
Sou cada mão que marca o número,
do telefone amigo que não toca.
Sou cada noite
acordada,
aguardando pelas novas que não chegam.
Sou o relógio onde as horas pararam.
Sou aquele corpo na berma, inerte e tapado,
aguardando a gentileza,
da minha transferência para o necrotério.
Sou o pedido
de desculpas que não veio.
Sou a saudade do verde deste País.
Sou a esperança de um nunca mais.
Sou este nosso - agora - Portugal.
Texto da Autoria de Lurdes Mesquita Babo
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