Perdido
Teve vergonha, tanta que lhe atravessou os ossos e entranhou-se pela medula. Imaginou que tal podia vir a acontecer-lhe mas, até então, nunca lhe sucedera. Assim que viu que era ela, tomou a resolução de não se revelar. Aninhou-se junto de um automóvel estacionado e, nesse momento, tomou consciência do quanto a sua vida se vinha arrastando pela lama. Ao mesmo tempo achou-se ridículo: como se fosse possível que ela o reconhecesse! Tez escura de quem vagueia pelas ruas da cidade enquanto o sol o beija; odor no-perfume de quem tem de pedir por favor água para se lavar; roupas cujas cores claras se transformaram em escuras- de quem faz do chão o seu cobertor. Sequelas de quem não aguentou um rasgão mor no coração. Amor na conjugação do pretérito passado, inconciliável com a sua forma futura. Sentimento de perda que o fez desorientar-se: sem rumo, sem destino, apenas deixando os dias passar.
Como ela continuava bonita!
Sentiu-se invadido pela típica saudade portuguesa.
Veio-lhe à memória quando lhe disseram que um amor se cura com outro. Mas ela havia ferido de morte - três vezes - o seu coração. Partiu e com ela levou, em modo de alienação parental, os dois filhos - os quais disseram estar do lado da mãe. Ainda defendeu que amor parental não tem lados, mas eles acharam que sim.
Só que, ninguém se levanta e segue em frente como se nada fosse, sobretudo depois de lhe esvaziarem o coração. E quando o coração fica desabitado, o corpo perde-se nas vielas da vida e não encontra o caminho de volta para casa.
Naquele dia, a cidade estava envolta em nevoeiro. Ele seguiu-a. Ela afastou-se: mais e mais ainda. E ele perdeu-a no meio da neblina: tal qual Dona Sebastiana.
Adorei .
ResponderEliminarMas nessa história deve haver muita realidade, pelos vãos das escadas, nos bancos do jardim, debaixo das pontes... Um sem número deles e delas de coração esvaziado. 🖤
É a vida! E ninguém está isento...
ResponderEliminarÉ a vida! E ninguém está isento...
ResponderEliminarÉ a vida! É ninguém está isento...
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