O mundo ao contrário
O mundo aproveitou-se da pandemia e virou-se ainda mais ao contrário. O mundo ficou mais surdo e cego. Os fantasmas do passado voltaram. Aqui e ali, na negritude que me vai na mente reaparecem, como se fossem faíscas, palavras que me havia imposto não mais pronunciar. Eis-me, de novo, a implorar para que o mau tempo passe. Mas elas por lá pairam: revolta, solidão, incompreensão… E eu vejo-me a escorregar - devagarinho é certo - mas ainda assim já descendo demasiado. O chão cada vez mais perto - mas ainda de pé.
Nem de propósito.
Acabei de saber que alguém de cinquenta anos se decidiu pelo seu fim.
Contam-me que pediu para que a ouvissem - mas ninguém teve tempo.
Dizem-me que não estava bem – mas ninguém a ajudou.
Quanto a ela, após a tomada da dura decisão, foi abraçar aqueles que não tiveram tempo para ela. E ainda lhes pediu desculpa. Quiçá lhes tenha pedido perdão por existir e desculpa por partir. É tudo tão contraditório e desolador! - perceber que ninguém aprendeu nada nestes últimos dois anos. Apelidam-nos de “dois anos perdidos” – o que não podia ser mais verdadeiro.
Quando uma doença rara escolhe alguém – só resta aprender a lidar com
ela.
Quando uma doença rara não tem cura - só podemos aceitá-la.
Ainda assim, por vezes, aparecem uns iluminados que nos pedem para lhe provarmos o óbvio: que somos eternamente doentes. E exigem que façamos uma maratona para o provar, gastando fortunas. O que é simplesmente ridículo. porque o óbvio está no nosso âmago que, por sua vez, por osmose, se manifesta na pálida cor da nossa face!
Para quem vive assim, a sobrevivência acontece quando as fraquezas se transformam em forças. É também desta matéria que somos feitos. Quanto a mim: prová-lo-ei!
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