DOCE – AMARGA - VISÃO

Era tão, mas tão bonito de se ver, que quem via de fora não conseguia deixar de jorrar água das suas pérolas visuais, dada a forma como ficava a sua alma remexida com tal cenário.
Que visão doce aquela, daqueles dois companheiros de antanho, ossos das mãos doridos, mas bem coligados,
sentados nos antigos assentos de quatro pernas de madeira e veludo nas costas, da sua sala de assentar e olhares fixos no velho monitor da tv.
Missão Sorriso em forma de companhia.
Quanta ternura brotava daquele quadro real que representava um par formado por duas vidas.
Incrível quão pouco – agora - tinham!
Apenas da parceria dos seus – quase esqueletos - e do som da tevê assumindo esta, forma “humana“ de missão, quase impossível, de companhia.
Era - o quase final - da dança das cadeiras das suas vidas. Optaram, por imposição da vida, dançarem sozinhos e sentados.
No seu íntimo era mais a revolta das cadeiras que sentiam - tantas naquela sala de assento - vazias de gente.
Os seres que podiam arrancá-los da respectiva sala ou tão-só, sentarem-se, lado a lado - corpos humanos versus esqueletos – giravam agora mundo fora.
Verdade que outrora também eles tinham girado.
Em nome próprio - mas também - pelos agora ausentes e tendo-os sempre bem presentes: na sua cabeça, no seu coração, nas suas decisões.
Nessa ocasião eram corpos humanos versus corpos humanos.
Tudo por eles.
Tudo com eles.
Hoje só eles, aqueles dois.
Ah, não esquecer, quão injusto seria, a companhia das pernas de assento de madeira com costas em veludo e a velha tevê.
Quão enganador se revelou aquele inicial espelho reflector; mentira - a bandeiras despregadas - sobre a imagem daquele par fazendo-a parecer, o que não era, perante as pérolas visuais dos curiosos e dos ausentes. Estes a quem pertenciam os lugares na sala de assento.
Tão ilusória, afinal, aquela doce visão inicial.


Texto da autoria de Lurdes Mesquita Babo

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